Conheça o teor da PEC 241 que suspende as vinculações de receitas para a Educação e a Saúde.

16/09/2016 16/09/2016 16:07 1879 visualizações
ANÁLISE DA PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO (PEC 241/2016), QUE TRATA DO NOVO REGIME FISCAL DA UNIÃO E DA SUSPENSÃO DAS VINCULAÇÕES DE RECEITAS PARA A EDUCAÇÃO E A SAÚDE

I – CONTEÚDO DA PEC

I.I - Prazo de vigência: 20 anos, com possibilidade de afrouxamento do ajuste fiscal a partir do 10º ano.

I.II – Abrangência:

a. Suspende as vinculações constitucionais para a saúde e a educação, ficando essas e outras áreas sociais condicionadas à regra de reposição pelo IPCA;

b. Impõe limite do IPCA para as políticas sociais e para as remunerações e carreiras de todos os Poderes da União e órgãos federais com autonomia administrativa e financeira integrantes dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social, compreendendo o Poder Executivo, o Poder Judiciário, o Poder Legislativo, inclusive o Tribunal de Contas da União, o Ministério Público da União e a Defensoria Pública da União, além das entidades da administração pública federal direta e indireta, dos fundos e das fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público e das empresas estatais dependentes.

I.III - Regra para implantação do arrocho fiscal: a cada ano será considerada a despesa primária corrente do ano anterior (excetuando-se as despesas financeiras com juros da dívida), acrescida no máximo à inflação medida pelo IPCA-IBGE, também do ano anterior. A regra é a mesma proposta para o PLP 257, que atinge os servidores públicos estaduais, podendo ser estendida aos municipais. E caso a receita anual fique abaixo da inflação, nem mesmo o IPCA será considerado para reposição salarial dos servidores públicos e para os investimentos nas áreas sociais.

I.IV - Impacto no financiamento da Educação e da Saúde, à luz da CF-1988: a. Flexibiliza o percentual de vinculação para investimentos em saúde nas três esferas administrativas.

Art. 198, da CF (SUSPENSO POR 20 ANOS) “§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre:

I - no caso da União, a receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro, não podendo ser inferior a 15% (quinze por cento).”

b. Flexibiliza o percentual de vinculação para investimentos em educação nas três esferas administrativas.
Art. 212, caput da CF. (SUSPENSO POR 20 ANOS). “Caput - A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.”

I.V - Principais consequências da PEC 241:
a. Freia a expansão do financiamento em políticas sociais de saúde e educação (e outras).

b. Limita a política remuneratória dos servidores federais (sendo que, nos estados, o PLP 257 terá efeito semelhante), a título de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração, inclusive do previsto no inciso X do caput do art. 37 da Constituição, exceto os derivados de sentença judicial ou de determinação legal decorrente de atos anteriores à entrada em vigor da Emenda Constitucional que instituiu o Novo Regime Fiscal.

c. Suspende a criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa na administração federal (e as demais esferas serão regidas pelos mesmos princípios constantes no PLP 257).

d. Não permite alterações na estrutura de carreira dos Poderes e Órgãos federais que impliquem aumento de despesa, tal como foi proposto no PLP 257 aos servidores estaduais.

e. Veta a admissão ou a contratação de pessoal, a qualquer título (inclusive por concurso público), ressalvadas as reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa e aquelas decorrentes de vacâncias de cargos efetivos (idêntico ao PLP 257).

I.VI - Não estão incluídos nos limites estabelecidos pela PEC 241:
a. Os repasses da União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, da participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural (art. 20, § 1º da CF);

b. As transferências de impostos da União a Estados, DF e Municípios, estabelecidas nos artigos 157 a 159 da Constituição Federal.

c. As cotas estaduais e municipais da arrecadação da contribuição social do salário-educação (art. 212, § 6º da Constituição Federal).

d. A complementação da União ao FUNDEB (art. 60, V do ADCT-CF).

e. Os créditos extraordinários para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública (art. 167, § 3º da CF).

f. As despesas com a realização de eleições pela justiça eleitoral.

g. Outras transferências obrigatórias derivadas de lei que sejam apuradas em função de receita
vinculadas; e

h. As despesas com aumento de capital de empresas estatais não dependentes.

I.VII – Penalidades para caso de descumprimento das regras fiscais:
No caso de descumprimento dos limites de gastos com pessoal dos três poderes da esfera federal, aplicam-se, no exercício seguinte, ao Poder ou ao órgão que descumpriu o limite, as seguintes vedações:

a. Impossibilidade de concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de servidores públicos, inclusive do previsto no inciso X do caput do art. 37 da Constituição, exceto os derivados de sentença judicial ou de determinação legal decorrente de atos anteriores à entrada em vigor da Emenda Constitucional que instituiu o Novo Regime Fiscal;

b. Impossibilidade de criar cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;

c. Impossibilidade de alteração na estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

d. Impossibilidade de admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa e aquelas decorrentes de vacâncias de cargos efetivos;

e. Impossibilidade de realização de concurso público.

f. Impossibilidade de financiar despesa nominal com subsídios e subvenções econômicas em patamar superior ao realizado no exercício anterior; e

g. Impossibilidade de conceder ou ampliar incentivos ou benefícios de natureza tributária que decorram em renúncia de receita.

II – CONTEXTO POLÍTICO
A PEC 241/16, proposta pelo governo interino de Michel Temer, vai ao encontro da perspectiva de agentes do mercado financeiro e de instituições multilaterais, como FMI e Banco Mundial, no sentido de restringir os investimentos em políticas públicas e priorizar o pagamento da dívida.
O objetivo do governo interino também se volta para o resgate do “grau de investimento” que foi retirado do país pelas agências de risco – as mesmas que contribuíram com a derrocada mundial ao não informar seus clientes sobre a gigantesca “bolha” que se formou no mercado imobiliário americano, com repercussão nos mercados financeiro e de capitas de todo o planeta.
Do ponto de vista formal, a propositura da PEC carece de legitimidade, pois além de amparar-se em interesses de um governo golpista, seu ponto nevrálgico – as desvinculações de receitas para as políticas de educação e saúde e o arrocho salarial dos servidores públicos da União – não foram referendadas pela sociedade nas urnas.

Também o fato de um governo provisório estar propondo mudanças de tamanha envergadura no texto constitucional, com amplo impacto na organização da sociedade, especialmente sob o aspecto da retirada de direitos fundamentais conquistados ao longo de décadas, faz com que a PEC 241 sofra de vício de origem, embora a tese não seja de fácil aceitação no ambiente contaminado pelo golpe institucional.

Quanto ao mérito da proposição do Executivo Federal ao Congresso, a flexibilização dos artigos 198 e 212 da Constituição Federal atinge gravemente o financiamento de duas principais políticas públicas – a educação e a saúde.

Na saúde não é difícil imaginar que a atendimento pelo SUS ficará mais restrito – como já tem anunciado o ministro da pasta – e que os gestores públicos terão enormes dificuldades em manter as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), com as especialidades, assim como o programa Mais Médicos e o SAMU, todas políticas que até então contavam com recursos locais próprios (garantidos pela CF- 1988) e com significativo repasse de verbas da União.

Na educação, o desmonte também será de grandes proporções.
Em primeiro lugar, as metas do Plano Nacional de Educação, que dependem de mais recursos públicos, estão todas comprometidas. Isso porque não se prevê crescimento de verbas acima da inflação. Ou seja, o investimento novo, de fato, não ocorrerá. Daqui a 20 anos, em se mantendo os efeitos da PEC 241, corre-se o sério risco de não se investir nenhum centavo a mais do que será repassado à área neste ano de 2016, quando muito a reposição inflacionária.

O piso salarial do magistério, que no PLP 257 poderia contar com aumento real concedido pela esfera federal, nos termos do art. 5º da Lei 11.738 – embora o impacto nos planos de carreira estivesse prejudicado –, com a PEC 241 não contará em hipótese alguma com ganhos reais (no máximo a inflação pelo IPCA).
A aprovação da PEC 241 comprometerá o financiamento da educação, mesmo em anos de expansão da receita tributária. Para fins de melhor visualização desse impacto, vejamos o quadro abaixo, que simula a aplicação de seu mecanismo de correção, através do IPCA, no orçamento do MEC entre 2007 e 2016.

O FUNDEB, grande conquista da sociedade na perspectiva de aumento e expansão do financiamento para toda a educação básica, deixará de contar com os recursos até então assegurados pela CF-1988. O repasse da inflação não será capaz de manter e muito menos de ampliar os investimentos nas etapas e modalidades da educação básica, comprometendo, ainda, a política de valorização dos profissionais das escolas públicas.
Neste sentido, a contrapartida “agravante” do Estado brasileiro ao arrocho no serviço público consiste em intensificar as parcerias público-privadas, especialmente por meio de Organizações Sociais, que poderão administrar as redes de ensino e/ou as escolas públicas (além dos hospitais e outras áreas) sem a necessidade de contratar profissionais concursados, garantindo “economia” aos cofres públicos.

Em suma, a PEC 241 altera profundamente a estrutura de financiamento das políticas públicas de saúde e educação, e todas as demais, retroagindo em mais de meio século a garantia de direitos sociais previstos na Constituição – no caso da vinculação de impostos à educação, ela foi instituída em 1946, sendo que, em 1988, atingiu os percentuais até então praticados.

Assim sendo, o combate à PEC 241 é essencial para manter as políticas de inclusão social praticadas na última década, para preservar e melhorar a qualidade dos serviços públicos e para manter o caráter republicano de contratação de servidores públicos, com a perspectiva de valorizar esses trabalhadores.

Veja também: Nota Técnica Os impactos das mudanças demográficas na seguridade social e o ajuste fiscal.
file:///C:/Users/usuario/Downloads/20160916154343_os_impactos_das_mudancas_demograficas_na_seguridade_social_e_o_ajuste_fiscal_1_1_.pdf


Brasília, 22 de junho de 2016
*Análise da Emenda pela CNTE.